quarta-feira, 3 de julho de 2013

ARTIGO DA SEMANA

BEZERRA NETO - Jornalista e escritor

E-mail: bzneto@gmail.com


 "Cara de caneca 
         amassada”


    O vendedor ambulante passava todos os dias e à mesma hora com o seu tabuleiro de quebra-queixo, vendendo o produto que prepara a noite para vender durante o dia: - “Ô o quebra-queixo docinho, docinho”!... – Ganhou o incômodo apelido de “cara de caneca amassada” depois que, num assalto sofrido na mocidade, os bandidos tomaram-lhe o dinheiro, o tabuleiro e ainda lhe achataram a cara, inclusive desfigurando-lhe o nariz. E, durante quase trinta anos ele conviveu com essa alcunha infame, suportando tudo na maior calma e tolerância, não deixando que isso afetasse o seu negócio. Levava na ‘esportiva’ o achincalhe da meninada e até passou a observar que as vendas cresceram nos últimos anos justamente em razão do malfadado apelido, que o tornou mais conhecido. Portanto, não ia deixar que a brincadeira dos meninos viesse interferir no seu pequeno comércio de quebra-queixo, com o qual sustentava a família. Passou em suportar tudo com moderação, não partindo para a revanche de se atritar com seus fregueses.  
       Mas, num desses dias, eis que o pobre homem ‘perde a cabeça’ e o bom senso, por não aguentar mais ser tratado pejorativamente de "cara de caneca amassada". E, irrefletidamente, arremessou uma pedrada contra um de seus detratores, ferindo-o mortalmente. Foi preso e encarcerado, sofria e maldezia a sorte de não poder pagar um bom advogado para representá-lo no processo que corria na justiça.  Por outro lado, seu negócio de vender quebra-queixo ia por água abaixo e, assim, a mulher e filhos, já estavam sofrendo com a falta de dinheiro: aluguel de casa atrasado, água, luz e algumas prestações... Foi, então, que um jovem estando para se formar em direito, tendo que representar um réu em causa pública, o procurou na intenção de defendê-lo no Tribunal do Júri. Aí, com a garantia de ter agora um defensor sem pagar nada, o prisioneiro se alegrou e se preparou para enfrentar os trâmites da justiça e esperar pela sua absolvição, apoiando-se na fé que tinha em Deus.
      A aristocrática família do jovem formando se esmerava ao receber seus convidados, com solene recepção, estando tudo preparado para o momento da investidura do recém formado bacharel; ele havia concluído os estudos pela Universidade de Harvard e seu pai, milionário, tinha grandes planos para o futuro do filho. A sessão começa; muita discussão em torno do polêmico “cara de caneca amassada”. No arrazoado, o advogado usou de uma estratégia um pouco não convencional, mas que deu certo. Andando com passos coordenados e lentos, foi até o Juiz – “Meritíssimo doutor Juiz de Direito”! (pausa). Passeou calmamente até o Corpo de Jurados e depois voltou ao Juiz: “Meritíssimo doutor Juiz de Direito”! (pausa). Na terceira vez que quis usar desta manobra as pessoas já se entreolhavam e remexiam-se nas cadeiras, se inquietando, percebendo que a atuação do “eloquente” advogado ia ser um fiasco.
      O juiz, então, não aguentando o embaraço, “explodiu”: - Senhor advogado, o senhor não tem argumento ou quer me aborrecer com essa argumentação fajuta de “Meritíssimo Doutor Juiz de Direito”? No que o advogado arrematou, ganhando a platéia e, conseqüentemente, a causa: - “senhores Jurados, viram que o doutor juiz, se ofendeu com tratamento de “Meritíssimo Doutor Juiz de Direito” em apenas três vezes que o tratei condignamente. Imaginem um homem que nunca freqüentou a escola, agüentar por durante 30 anos a alcunha de “cara de caneca amassada”. Peço ao nobre Corpo de Jurados que, sem delongas, absolva o meu cliente, que precisa retomar à sua rotina de vendedor de quebra-queixo e tomar conta de sua família. Os aplausos foram intensos e o homenageado contentou aos pais e convidados, pela esplêndida vitória!!!


ARTIGO DA SEMANA - de 03 a 10/05/08

Publicado aos sábados na Tribuna Independente

BEZERRA NETO - Jornalista e escritor
E-mail: bzneto@gmail.com



Garfo torto
     
      Contaram-me essa como piada, mas vejo-a no corriqueiro dos nossos dias, onde existem pessoas que só reparam no seu próprio umbigo, botando defeito em tudo o mais que existe fora dele. Numa reunião de trabalho, ou mesmo num colóquio entre amigos, parceiros, colegas, ativistas, essas estão mais para contestar do que para apoiar uma idéia, um ponto de vista qualquer, uma decisão, ou até mesmo qualquer iniciativa que venha beneficiar um grupo de pessoas onde elas mesmas possam está envolvidas. Sempre tomam posição contrária numa deliberação, dizendo ‘não’ a tudo, como se não atinassem que a vida não gira apenas no seu ‘exe mundi’, eixo sobre o qual gira a sua pobre cabeça de palha. Acham que somente elas detêm o dom da verdade e ninguém mais. No fundo são essas pessoas amáveis, prestativas, mas que se tornam ‘turronas’ quando não se lhes dão brecha onde possam derramar o seu ‘veneno’ de contestação.
      Tenho um amigo ao qual me escuso de abordá-lo quando diante de pessoas estranhas, porque ele logo vem intermediando controvérsias. Faz apologia à sua própria palavra!... Tenho outro amigo, que prezo muito, um escritor renomado, que não abre a boca sem antes pronunciar um ‘não’, logo de cara: “Não, eu aceito a decisão da maioria!... Não, aprovo sim! Meu voto é ‘sim’!... Acho que é do berço, da índole das pessoas, que vem essa frieza, essa distração de vida sem mérito e sem razão de ser. É um agir de gente tola, cujo único objetivo é ser notada pelos circunstantes. É um procedimento errôneo que jamais deve ser imitado. Mas vamos à piada: um ilustre e fidalgo homem, de muitas posses, quis comemorar o aniversário de seu casamento com um jantar, e para isso distribuiu convites entre amigos do casal.
      Por educação, teve que convidar um elemento conhecido de todos como “o boca livre”, que não era bem aceito em lugar nenhum, por “botar gosto ruim” em tudo, além de sair falando mal de qualquer ocasião. O fidalgo sabia do risco que iria correr, mesmo assim mandou convidar “o coisa ruim”, para atender ao pedido do filho. Porém tomou o cuidado de estacar dois garçons só para servi-lho, recomendando que não deixassem que nada lhe faltasse: uísque, do bom e do melhor, gelo, o jantar posto. Ficou de ‘olho’ nos garçons para ver se tudo corria bem. À saída dos comensais, esbarrou com o impetuoso e quis saber se tudo tinha saído a seu gosto: - como lhe trataram, amigo? No que obteve como resposta: tudo teria sido ótimo, às mil maravilhas, se o desgraçado do garçom não tivesse me dado um garfo torto!...

          Se eu to alegre
Eu ponho os óculos e vejo tudo bem
Mas se eu to triste eu tiro os óculos
E não vejo ninguém”



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